A PRIMAVERA AMERICANA E O LEGADO DE MIGUEL BALDEZ
Palavras-chave:
Pandemia, Despoliciamento, Movimentos Sociais, Vidas Negras ImportamResumo
O presente artigo pretende analisar o levante popular nos Estados Unidos da América, no contexto da pandemia de COVID19 deflagrado pela morte de George Floyd por policiais na cidade de Minneapolis, à luz dos ensinamentos do professor e advogado de movimentos sociais Miguel Baldez, mormente do Direito Insurgente e do Direito Achado na Rua. Os protestos que varreram os Estados Unidos aspiram a revisão radical das políticas de segurança pública e justiça criminal, ampliam a discussão do racismo estrutural em todas as suas facetas e debatem o racismo de forma jamais vista antes. Os movimentos populares clamam diversas reformas no sistema de justiça criminal e tais demandas vão desde a diminuição drástica do orçamento da polícia em diversas cidades até a erradicação da polícia.
ABSTRACT
This article intends to analyze the popular uprising in the United States of America, in the context of the COVID19 pandemic, triggered by the killing of George Floyd by police officers in the city of Minneapolis, in the light of the teachings of the professor and lawyer of social movements Miguel Baldez, especially of Insurgent Law and of Law Found on the Street. The protests that have swept the United States in 2020 have sparked a debate over a radical overhaul of public security and criminal justice policies; a broadening of the discussion of structural racism in all its facets; and new and unprecedented conversations about race. Popular movements are calling for several reforms to the criminal justice system, with such demands ranging from the drastic reduction of police budgets in several municipalities to the elimination of the police.
Downloads
Referências
BIBLIOGRAFIA
ALFONSIN, Jacques Távora. Dos nós de uma lei e de um mercado que prendem e excluem aos nós de uma justiça que liberta. In: RENAP, Rede Nacional de Advogados Populares. Advocacia popular. Caderno Especial 1995-2005. Cadernos RENAP, nº 6, Março de 2005, p. 83-103.
BALDEZ, Miguel Lanzellotti. A luta pela terra urbana. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz & CARDOSO, Adauto Lucio (Orgs.). Reforma Urbana e Gestão Democrática: promessas e desafios do Estatuto da Cidade. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 2003.
BALDEZ, Miguel Lanzellotti. Direitos Humanos, mas como? In: Revista Direito, Sociedade e Cultura. Vitória: 2011. Disponível em: http://direitosociedadecultura.blogspot.com/2011/03/direitos-humanos-mas-como.html Acesso em: 15 ago. 2020.
CDC. Centers for Disease Control and Prevention. Health Equity Considerations and Racial and Ethnic Minority Groups. Disponível em: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/community/health-equity/race-ethnicity.html. Acesso em: 23 ago. 2020.
COBB, Jelani. An American Spring of Reckoning. Disponível em: https://www.newyorker.com/magazine/2020/06/22/an-american-spring-of-reckoning?reload. Acesso em: 27 ago. 2020.
CRC. Johns Hopkins Coronavirus Resource Center (CRC). Disponível em: https://coronavirus.jhu.edu/us-map. Acesso em: 26 ago. 2020.
DUTT-BALLERSTADT, Reshmi, "Colonized Loyalty: Asian American Anti-Blackness and Complicity" (2020). Faculty Publications.Published Version. Submission 78. Disponível em: https://digitalcommons.linfield.edu/englfac_pubs/78. Acesso em 11/08/2020.
GREENHOUSE, Steve. The Coronavirus Pandemic Has Intensified Systemic Economic Racism Against Black Americans. The New Yorker. Disponível em:https://www.newyorker.com/news/news-desk/the-pandemic-has-intensified-systemic-economic-racism-against-black-americans Acessado em: 27 ago. 2020.
LYRA FILHO, Roberto. "O Que é Direito". Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1995.
MBEMBE, Achille. O fardo da raça. São Paulo: N-1 Edições, 2018.
New York Civil Liberties Union. “Stop-and-Frisk Data.” https://www.nyclu.org/en/stop-and-frisk-data. Acesso em: 26 ago. 2020.
SANTOS, Boaventura de Souza. A cruel pedagogia do vírus. 1a. Ed. São Paulo: Boitempo, 2020. P. Disponível em: https://play.google.com/store/books/details?id=ZJXcDwAAQBAJ. Acesso em: 21 ago. 2020.
SOUTO, Cláudio in Introdução Crítica ao Direito Agrário. Org. Mônica Castagna Molina, José Geraldo de Souza Júnior, Fernando da Costa Tourinho Neto. Série O Direito Achado na Rua. Programa de Capacitação Continuada à Distância. GTRA-DEX/FD/NEP/NED/Editora UnB. Brasília: 2002.
STATE OF NEW YORK. Committee on Rules. Emenda supressiva da Seção 1, Seção 50-A. Section 1. Section 50-A. Disponível em: https://legislation.nysenate.gov/pdf/bills/2019/A10611. Acesso em: 05 ago. 2020.
WEAVER, Hilary. Revista Elle. Disponível em: https://www.elle.com/culture/celebrities/a32787852/selena-gomez-black-lives-matter-alicia-garza-instagram/. Acesso em: 10 ago. 2020.
ZIMMER, Ben. In Revista eletrônica The Wired. Disponível em: https://www.wired.com/2014/12/ben-zimmer-on-i-cant-breathe/. Acesso em: 10 ago. 2020.
Notas:
[1]Sobre a autora: Advogada formada em Direito pela Faculdade Evandro Lins e Silva/IBMEC (2007). Pós graduada em Direito Imobiliário pela PUC/RJ (2011). Participou do Grupo de Extensão NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídico Popular (2003-2006) coordenado pelo professor Miguel Baldez. Participou do Grupo de Pesquisa em Processo Civil orientada pelo Miguel Baldez (2004-2005). Trabalhou também como assistente do professor Baldez na organização de seu acervo pessoal (2005).
[2]SANTOS, Boaventura de Souza. A cruel pedagogia do vírus. 1a. Ed. São Paulo: Boitempo, 2020. P.21. Disponível em: https://play.google.com/store/books/details?id=ZJXcDwAAQBAJ. Acesso em: 21 ago. 2020.
[3]SANTOS, Boaventura de Souza. A cruel pedagogia do vírus. 1a. Ed. São Paulo: Boitempo, 2020. P. 6. Disponível em: https://play.google.com/store/books/details?id=ZJXcDwAAQBAJ. Acesso em: 21 ago. 2020.
[4]Do inglês Health Equity Considerations and Racial and Ethnic Minority Groups. O termo grupos minoritários raciais e étnicos inclui pessoas de cor com uma ampla variedade de origens e experiências. Mas algumas experiências são comuns a muitas pessoas dentro desses grupos, e os determinantes sociais da saúde historicamente os impediram de ter oportunidades justas de saúde econômica, física e emocional.
[5]Centers for Disease Control and Prevention - CDC. Health Equity Considerations and Racial and Ethnic Minority Groups. Disponível em: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/community/health-equity/race-ethnicity.html. Acesso em: 23 ago. 2020.
[6]Em média, os trabalhadores negros ganham apenas setenta e três por cento do que os trabalhadores brancos ganham, de acordo com o Economic Policy Institute, um think tank progressista, que também descobriu que graduados universitários negros ganham 22,5% menos do que graduados universitários brancos. A renda familiar média para famílias brancas era setenta por cento maior do que para famílias negras em 2018, $ 70.642 contra $ 41.692. Estudo levantado por GREENHOUSE, Steve. The Coronavirus Pandemic Has Intensified Systemic Economic Racism Against Black Americans. The New Yorker. Disponível em:https://www.newyorker.com/news/news-desk/the-pandemic-has-intensified-systemic-economic-racism-against-black-americans Acesso em: 27 ago. 2020.
[7]Centers for Disease Control and Prevention - CDC. Health Equity Considerations and Racial and Ethnic Minority Groups. Disponível em: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/community/health-equity/race-ethnicity.html. Acesso em: 23 ago. 2020.
[8]New York Civil Liberties Union. “Stop-and-Frisk Data.” https://www.nyclu.org/en/stop-and-frisk-data. Acessado em 26/08/2020.
[9]Tradução da autora. The Sentencing Project. Report to the United Nations on Racial Disparities in the U.S. Criminal Justice System. Disponível em: https://www.sentencingproject.org/publications/un-report-on-racial-disparities Acesso em: 23 ago. 2020.
[10]Ações diretas como sit-ins e walk-outs foram formas de ação não violentas comumente organizadas à época foram fruto de influência que teve Mahatma Gandhi em Martin Luther King Jr..
[11]Para uma visão sistematizada por ordem cronológica dos protestos e outras formas de desobediência civil ocorridos no bojo do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos da América. Disponível em: https://civilrightstrail.com/timeline/. Acesso em: 12 ago. 2020.
[12]MBEMBE, Achille. O fardo da raça. São Paulo: N-1 Edições, 2018.
[13] O dados foram contabilizados pelo Johns Hopkins Coronavirus Resource Center (CRC). Disponível em: https://coronavirus.jhu.edu/us-map. Acesso em: 26 ago. 2020.
[14] Tradução da autora do inglês para I can’t breathe.
[15]MBEMBE, Achille. O fardo da raça. São Paulo: N-1 Edições, 2018.
[16]Tradução da autora para Ferguson Unrest.
[17]O movimento foi criado por Alicia Garza, Patrisse Cullors e Opal Tometi no ano de 2012 após a morte do adolescente Trayvon Martin na Flórida por um segurança de vizinhança voluntário branco.
[18] A título ilustrativo, na cidade de Nova Iorque, há protestos todos os dias desde o dia em que George Floyd foi morto. Podem ser observados diversas modalidades de ações diretas, tais como limpeza de ruas, concertos de voluntários ao ar livre, aula de história ou cultura Afro e assim por diante. Sempre liderados por Afrodescendentes, tais manifestações ganham as ruas da cidade. Há desde manifestantes solitários como o septuagenário que todos os dias às 8 da noite vai à uma movimentada esquina do Upper West Side com um cartaz onde se lê: “Se você é contra o racismo, junte-se a mim. Estou aqui todos os dias, faça chuva ou faça sol”, ou como o protesto sobre rodas que ocorre todos os finais de semana à tarde desde aquele fatídico 25 de maio. A Massa Crítica reúne milhares de pessoas, tendo um deles alcançado o incrível número de 17.000 pessoas em bicicletas, o maior número de manifestantes que a cidade de Nova Iorque já reuniu em uma única ação direta sobre rodas. As formas de protesto e ação direta contam-se aos milhares apenas nos Estados Unidos e não podem ser aqui aprofundadas sem que haja um desvirtuamento de nosso objeto. No entanto, deve-se apenas considerar que foram criadas zonas autônomas em algumas cidades dos Estados Unidos, ficando a mais conhecida em Seattle, no estado de Washington, a chamada CHAZ, Capitol Hill Autonomous Zone. Tais zonas reúnem participantes de movimentos populares que ali vivem até que suas demandas sejam atendidas. Salienta-se que não há interveniência do Estado e as zonas autônomas têm como característica a ausência de liderança e o autogoverno. A CHAZ em Seattle ocupou seis quarteirões e durou quase um mês. Foi dissolvida violentamente pelos policiais com uso de bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo. Na cidade de Nova Iorque houve ocupação da praça em frente à prefeitura por mais de um mês por centenas de pessoas até também ser dissolvida pela polícia em um episódio marcado de violência. Esta ação direta ganhou o nome de Occupy City Hall.
[19] A frase entrou para o Yale Book of Quotations no ano de 2014, como alerta o linguista Ben Zimmer in ZIMMER, Ben. Revista eletrônica The Wired. Disponível em: https://www.wired.com/2014/12/ben-zimmer-on-i-cant-breathe/. Acesso em: 10 ago. 2020.
[20] Asiáticos, latinos e indígenas já de longa data são cúmplices do movimento pela liberação negra nos Estados Unidos. Para mais detalhes sobre a cooperação entre minorias contra a supremacia branca ver DUTT-BALLERSTADT, Reshmi, "Colonized Loyalty: Asian American Anti-Blackness and Complicity" (2020). Faculty Publications.Published Version. Submission 78. Disponível em: https://digitalcommons.linfield.edu/englfac_pubs/78. Acesso em: 11 ago 2020.
https://truthout.org/articles/colonized-loyalty-asian-american-anti-blackness-and-complicity/ https://digitalcommons.linfield.edu/englfac_pubs/78/
[21] Disponível em: https://www.apmreports.org/story/2020/06/30/what-happened-at-minneapolis-3rd-precinct. Acesso em: 15 ago. 2020.
[22]LYRA FILHO, Roberto. "O Que é Direito". Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1995. P.44.
[23] LYRA FILHO, Roberto. "O Que é Direito". São Paulo: Editora Brasiliense. Ed, 1995. P. 53
[24]BALDEZ, Miguel Lanzellotti. A luta pela terra urbana. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz & CARDOSO, Adauto Lucio (Orgs.). Reforma Urbana e Gestão Democrática: promessas e desafios do Estatuto da Cidade. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 2003. p. 77.
[25] BALDEZ, M. L. Direitos Humanos, mas como? Revista Direito, Sociedade e Cultura., 15 mar. 2011. Disponível em: http://direitosociedadecultura.blogspot.com/2011/03/direitos-humanos-mas-como.html. Acesso em: 15 ago. 2020.
[26] A autora aqui pede licença para homenagear o professor Miguel Baldez e cometer o deslize linguístico ao usar a palavra presentar em vez de representar. Como advogado de movimentos populares, Baldez costumava dizer que o movimento não conta com representantes, mas sim com presentantes. Todos têm voz e ninguém fala em nome de ninguém. O movimento é uno e cada corpo falante traz consigo a força do todo. Talvez aqui enfrentamos um problema de insuficiência da língua para comunicar a prática da rua. O verbo presentar é usado na língua Espanhola, mas não em nossa língua Portuguesa.
[27]Disponível em: https://www.newyorker.com/news/annals-of-activism/can-minneapolis-dismantle-its-police-department. Acesso em: 11 ago 2020.
[28]https://kstp.com/politics/minn-panel-requests-more-time-on-plan-to-dismantle-police-august-5-2020/5818011/. Acesso em 13 ago. 2020.
[29]Disponível: https://www.cbsnews.com/news/minneapolis-city-council-intent-disband-police-department/ Acesso em: 24 ago. 2020.
[30]STATE OF NEW YORK. Committee on Rules. Emenda supressiva da Seção 1, Seção 50-A. Section 1. Section 50-A. Disponível em: https://legislation.nysenate.gov/pdf/bills/2019/A10611. Acesso em: 11 ago. 2020.
[31] Do inglês, no-knock warrant.
[32]WEAVER, Hilary. Revista Elle. Disponível em: https://www.elle.com/culture/celebrities/a32787852/selena-gomez-black-lives-matter-alicia-garza-instagram/. Acesso em: 10 ago. 2020.