COLETANÊA CVENB – 57ª SUBSEÇÃO OAB – BARRA – RJ COMISSÃO DA VERDADE DA ESCRAVIDÃO NEGRA NO BRASIL

EDITORIAL

 

INVISIBILIDADES

REFLEXOS DO RACISMO E DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL

Organização:

Presidente: Dra. Elisabeth Baraúna

Vice Presidente: Dr. Julio Cesar Costa Manoel

AGRADECIMENTOS

Ao idealizar esta obra, a intenção sempre foi a de construir um legado esclarecedor para o 1° triênio de uma comissão tão relevante e tão pouco visibilizada no contexto intra e extra institucional, ainda mais na Barra da Tijuca, que, sem expressar tom pejorativo, mas realista, no que se refere à região, não está tão próxima da realidade que trata o objeto temático, porém sob uma gestão humanizada e comprometida com as ciências jurídicas e sociais que a subseção detém, a referida comissão é tida com muito apreço.

Diante disso, estando à frente desta responsabilidade de presidir a primeira CVENB na OAB BARRA-RJ, gostaria de expressar minha mais profunda gratidão à todos da gestão que contribuíram para a elaboração de todos os trabalhos já realizados e, principalmente, desta obra, aos meus presidentes Drs. Humberto Adami e Marcus Soares, igualmente às vices Dras. Alessandra Santos e Renata Mansur.

Em seguida, agradeço aos autores cujas pesquisas e narrativas formaram a base para este livro. Sem o trabalho incansável dos advogados, historiadores, estudantes, colaboradores e ativistas, a ideia para a compreensão profunda da invisibilidade dos reflexos do racismo e da escravidão no Brasil de hoje não seria possível.

Agradeço especialmente à Profª. Dra. Inez Stampa (PUC-RIO) e ao Prof. Dr. Lucio Almeida (UFRGS), cujas obras, conselhos e orientações pessoais forneceram uma inspiração inestimável e cujo compromisso com a justiça social é um exemplo a ser seguido.

Agradeço às companheiras pioneiras nesta Comissão Dras. Ingrid Fortunato e Tathyana Marques, cuja demonstração de persistência e coragem me impulsionaram a permanecer e dar continuidade ao trabalho.

Sou imensamente grata aos palestrantes que se dispuseram a ceder gotejamentos de seus conhecimentos e tempo para que a CVENB OAB BARRA-RJ se enriquecesse cada vez mais, assim como à equipe editorial da Editora Crescimento, especialmente ao membro Ailton Bezerra, por sua paciência, perspicácia e dedicação em trazer esta obra à vida.

Ao meu querido, competente e primoroso Vice-presidente, Prof°. Dr. Júlio Manoel, que me deu a paz que precisava no momento certo e ajudou em toda revisão, em seus comentários cuidadosos e sugestões valiosas que elevaram a qualidade deste livro.

Agradeço também às pessoas, escritórios, instituições e organizações que apoiaram a pesquisa e a publicação deste trabalho, foi fundamental ao fornecer espaço, recursos e apoio ao longo de todo o processo.

Muito obrigada aos envolvidos e atenciosos na confecção da obra: Ministra do TSE Dra. Vera Lúcia Santana, Conselheiro do CNJ Dr. Marcos Vinicius Jardim, Diretora de Biblioteca do IAB Dra. Márcia Dinis, Presidente da Academia Carioca de Direito Dra. Rita Cortez, Escritora Vilma Piedade e Ex-futebolista Colaborador Grafite, aos quais eu tenho um verdadeiro misto de grande carinho e amizade sólida.

Meu imenso carinho aos membros e não membros, promotores desta obra, cujos esforços incansáveis em divulgar e disseminar o conhecimento são vitais para a luta contínua contra o racismo e para a conscientização sobre a história da escravidão. Agradeço, ainda, ao Prof. Luciano Góes e a Dra. Carolina Barboza pela paixão e dedicação revelada e a nossa Griô Membra Consultora Honorária Desembargadora Aposentada Dra. Ivone Ferreira Caetano pelos ensinamentos e ouvidos atentos.

Por fim, louvo, enalteço e glorifico o nome do Senhor Deus e à minha ancestralidade por me manter de pé, na direção e determinação em concluir esse projeto num momento tão delicado da vida, não podendo esquecer a minha forte e aguerrida mãe, a D. Beth, que se lúcida estivesse, não se conteria de orgulho por todxs, aos meus lindos e amados filhos Luiz Felipe Baraúna e Luiz Gabriel Baraúna por me acompanharem com orgulho na caminhada, bem como aos poucos verdadeiros e imprescindíveis amigos, antigos e novos, pelo apoio incondicional e muita paciência durante os momentos de conflito e ausência, enquanto eu me dedicava às soluções deste projeto e às demandas da vida. Ter recebido colo, amor e compreensão foram cruciais para a conclusão desta jornada.

Este livro é um tributo à todos que lutaram e continuam a lutar pela igualdade e justiça. Que possamos continuar aprendendo com o passado para construir um futuro melhor.

Por derradeiro, de forma emocionada, gratidão e pleito de VISIBILIDADE às Mulheres Mães Pretas deste país: sempre fomos guerreiras e ainda somos Rainhas, temos coroa!

Sankofa!

Com amor,

Elisabeth Baraúna

Presidente da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da 57ª Subseção OAB BARRA-RJ

Triênio 2021-2024

 

 

APRESENTAÇÃO

A CVENB, Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da Subseção OAB Barra da Tijuca-RJ realiza uma iniciativa pioneira à jornada pela história não contada do Brasil. Neste livro, mergulharemos em temáticas da trajetória da Verdade da Escravidão Negra, explorando suas reflexões sobre o racismo e o processo de desumanização étnico racial que moldaram profundamente nossa sociedade.

As origens da escravidão no Brasil, desde os primeiros contatos entre europeus e africanos até a consolidação do sistema escravista, instituição cruel moldou não apenas a economia, mas também a cultura e as relações sociais do país.

Legados da Escravidão são profundas marcas deixadas na sociedade brasileira e resultam em como o racismo estrutural se perpetua até os dias de hoje, influenciando as disparidades socioeconômicas, o acesso à educação, saúde e oportunidades de trabalho.

O trabalho pioneiro da Comissão da Verdade da Escravidão Negra, criada para investigar e revelar a verdade sobre esse período obscuro da história brasileira, enfrenta os desafios do apagamento da história, bem como as descobertas surpreendentes do período escravagista e as recomendações para enfrentar as injustiças do passado e do presente.

As lições aprendidas com o trabalho da Comissão da Verdade da Escravidão Negra da OAB BARRA-RJ debate sobre a importância da memória coletiva, da reparação histórica e do combate ao racismo para construir um futuro mais justo e igualitário para todos os brasileiros.

Por fim, observando que a Seccional OAB-RJ segue em caminho certo de cumprimento da administração da justiça de todas as formas possíveis, enaltecemos o empenho dos membros da comissão, em especial à sua Presidente Dra. Elisabeth Baraúna e ao Vice-presidente Dr. Julio Manoel, bem como todos os coautores e todas as coautoras da obra.

Luciano Bandeira

Presidente da OAB-RJ

Ana Tereza Basilio

Vice-presidente da OAB-RJ

Marcus Soares

Presidente da 57ª Subseção OAB BARRA-RJ

Humberto Adami

Presidente da CEVENB OAB-RJ

Aderson Bussinger

Diretor do Centro de Documentos e Pesquisa da OAB-RJ

 

 

PREFÁCIO

A generosidade da Drª Elisabeth Baraúna ao me convidar para este Prefácio, só não é maior que sua entrega às causas que abraça no fazer profissional e político, aqui entendido na mais larga acepção, ante sua ativa participação em diversos coletivos, destaque à Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, da Subseção da Barra da Tijuca, da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, Seção do Rio de Janeiro.

Ao assumir encargo por demais honroso, impossível não me voltar ao tempo em que integrei a primeira composição da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, no âmbito do Conselho Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, sendo certo que tal proposição gerou a criação de comissões com igual propósito por todo o sistema da OAB, e o livro organizado pela Drª Elisabeth é um bem-acabado produto dessa empreitada, a partir da unidade entre integrantes da CVENB Barra da Tijuca/RJ.

Sobre o trabalho, talvez pioneiro entre as Comissões CVENB, sobressaem a qualidade das pesquisas, amplitude das abordagens, e mais, as referências bibliográficas permitem o aprofundamento e a busca de mais elementos sobre múltiplos aspectos e enfoques trazidos sobre as complexas relações raciais de um país que se fez à custa da escravização negra, por cerca de quatro séculos!

A persistência das desigualdades econômicas, culturais, sociais e de poder do país, se assenta na organização racial da sociedade, que sustenta um Estado gestado para manter privilégios em favor da branquitude dominante, e o faz à margem do estatuto constitucional firmado pela Assembleia Nacional Constituinte, com a chamada Constituição Cidadã de 1988.

De fato, em que pese a consagração da dignidade humana como princípio fundante da República Federativa do Brasil, nossa realidade demonstra, à exaustão, que não há qualquer compromisso político em imprimir efetividade às promessas de cidadania, bem-estar, para 56% de sua população, salvo recentes políticas afirmativas arrancadas pela mobilização do movimento negro!

A obra coletiva que a CVENB Barra da Tijuca/RJ nos apresenta, faz um sólido apanhado dessa realidade que revela a sistemática ação de uma sociedade radicalmente racista, apegada aos privilégios sustentados por uma ordem pública, estatal, dominada por representação minoritária de uma elite intrinsecamente autoritária.

Desse modo, o projeto substantivo, inclusivo, apregoado pela Constituição Federal, não passa de uma promessa com a qual os Poderes da República não se comprometeram em conferir tradução objetiva, na partilha das riquezas e exercício do poder, distante, portanto, da gestão da vida nacional com as presenças de todas e todos, mulheres e homens, “…sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, como assentado no inciso IV do artigo 3º da Carta Magna, ao erigir os objetivos fundamentais do país.

Ao esquadrinhar o Brasil real, a obra da CVENB Barra da Tijuca/RJ transita por densa análise de corte marxista para apreciar algumas nuances sobre o mundo do trabalho, com os cruéis impactos das reformas trabalhistas que precarizaram enormemente relações de trabalho que não se marcavam pela dignidade de trabalhadoras e trabalhadores, notadamente negros. Não por acaso, o país convive com elevados índices de trabalho em condições análogas ao trabalho escravo, sendo certo que é, majoritariamente negra, esta força de trabalho que experimente as modernas formas de escravização humana.

Noutra faceta, de igual relevância, temos uma provocativa discussão hermenêutica que legitimamente confronta marcos interpretativos do direito marcadamente excludentes, e como tal, a serviço de uma modelagem jurídica incriminadora da existência negra.

Ante o referencial de que o racismo no Brasil é estrutural, o trabalho envereda pela gênese da organização escravocrata, para também trazer luzes sobre o racismo ambiental, que crescentemente vítima populações quilombolas e mesmo grandes contingentes humanos periféricos das cidades de todo porte, numa crônica anunciada de desastres sociais que os extremos climáticos somente farão mais recorrentes e graves.

Essa percepção mais recente de manifestação do racismo ganha cada vez mais ressonância social e o vanguardismo do projeto expressa bem sua atualização com o debate emergente; os textos dão bem a dimensão do problema.

Paralelamente, interessante sistematização do iter normativo da escravidão desde o Império, oferece rico panorama sobre as lutas sociais que permearam a resistência à opressão em todo o período escravagista, mais as disputas econômicas sobre o tráfico negro para o regime, numa síntese pedagógica, bastante ilustrativa.

Sendo certo que o patriarcalismo, aliado ao racismo, impõe sobre as mulheres negras recortes especialmente sofridos de elevação dos níveis de exploração, naturalmente a reflexão que parte do conceito da necropolítica, encontra espaço próprio, e até pelo projeto genocida que estraçalha famílias negras, não raras vezes chefiadas por mulheres, há que ser realçada também a violência direta contra os corpos negros femininos – o feminicídio nos alcança com maior voracidade.

Em plena sintonia com o debate essencialmente feminista que traz à cena a questão tributária como fato indutor, fortalecedor de desigualdades de gênero,  também aqui o entrelaçamento patriarcal com a crueza operada pelo racismo, gera inevitáveis distorções e injustiças tributárias e o inovador estudo traz importante releitura histórica sobre ramo do direito que é verdadeiro nicho branco – o direito tributário.

Ante a essencialidade da presença negra na construção do Brasil, em que pese a conjugação das forças políticas dominantes para nos oprimir, excluir, subjugar, fato é que a República Federativa do Brasil não possui identidade nacional que não se confronte com a marca da negritude, quer na produção da economia, quer nas artes e na estética forjada pelas mulheres negras que jamais se furtaram à insurgência, à assertividade dos ideais libertários de Dandara, Luiza Mahin, Maria Felipa e tantas outras que seguem nos iluminando, nos inspirando.

E não por acaso, certamente, esse livro que nos oferece uma multiplicidade de olhares, saberes, com acurada sensibilidade nas escritas firmes e tão reveladoras da intelectualidade negra que desponta numa articulação sólida entre a pesquisa acadêmica e o fazer político ativo, teve a coordenação de uma mulher.

Sem pretensão de exaurimento sobre qualquer um dos temas que compõe a obra, só posso renovar o sentimento de gratidão por saudar o lançamento de tão relevante trabalho!

Vera Lúcia Santana Araújo, Ministra Substituta do Tribunal Superior Eleitoral

 

 

INTRODUÇÃO

     A coletânea intitulada “Invisibilidades: reflexos do racismo e da escravidão no Brasil”, organizada pela Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, da Subseção da Barra da Tijuca, da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, Seção do Rio de Janeiro, reúne artigos de pesquisadores e colaboradores da Comissão que compartilham suas perspectivas sobre a questão racial.

    Os reflexos do racismo e da escravidão permeiam cada aspecto da vida contemporânea. Desde os primórdios da colonização até os dias atuais, a herança desse legado se faz presente, moldando relações sociais, estruturas econômicas e políticas, e construindo narrativas indenitárias complexas. Esta coletânea de artigos acadêmicos busca adentrar as camadas profundas desse fenômeno multifacetado, oferecendo análises críticas, reflexões e perspectivas que ajudam a compreender a conjuntura brasileira.

     A obra promove um espaço de diálogo e de reflexão, em que pesquisadores, a partir de diferentes pontos de vista teóricos, convergem para discutir as dinâmicas complexas do racismo e da escravidão no contexto do nosso país e como tais estruturas estão presentes ainda hoje em nossa sociedade.

    Conforme leciona Silvio Almeida, há de se pensar o racismo para além de atos individuais, questões comportamentais ou eventual mau funcionamento institucional, mas como característica fundamental e estruturante da sociedade contemporânea. Nesse diapasão, os textos aqui reunidos objetivam oferecer essa visão mais abrangente e nos auxiliam a pensar em políticas de reparação e promoção da justiça social.

    O primeiro artigo, intitulado “Proteção social e o capital oportunista: a ‘inimizade’ perfeita no mundo do trabalho no Brasil” e escrito por Elisabeth Baraúna, analisa os impactos das recentes modificações legislativas no cenário trabalhista brasileiro, especialmente durante o ápice da pandemia de Covid-19, e como a agenda neoliberal tem fragilizado as garantias trabalhistas, afetando desproporcionalmente a população negra.

    O segundo artigo, “Racismo e injúria racista: a exunêutica como subversão epistemológica jus-quilombista”, de Luciano Góes, explora a interseção entre o racismo e o Direito Penal no Brasil, destacando como a abolição de 1888 perpetuou um sistema de controle racial, posteriormente legitimado pelo Código Penal de 1890 e pela Criminologia racista, ressaltando a necessidade de subverter essa lógica punitivista colonial para reconhecer e ampliar os direitos ancestrais dos negros.

     O terceiro artigo, “Aspectos da escravidão negra no Brasil e seus desdobramentos institucionais”, de autoria de James Stirling dos Santos, Anna Lila Chaves de Oliveira e Julio Cesar Costa Manoel, busca revelar as repercussões da escravidão legal na sociedade brasileira. O capítulo enfatiza os efeitos persistentes da escravidão ao longo de mais de três séculos e destaca os desafios contemporâneos enfrentados pelos negros brasileiros, além de abordar o conceito de racismo estrutural.

     “O complexo (ecossistema) Lagunar da Bacia de Jacarepaguá: justiça socioambiental e combate ao racismo ambiental”, escrito por Rodrigo Bertoli e Beth Bezerra, compõe o quarto texto da coletânea e analisa as dimensões sociais e ambientais do referido complexo, com destaque para a importância da preservação da fauna e da flora diante das pressões do adensamento populacional e da gentrificação. Discute o racismo ambiental na região, a ausência de controle e fiscalização do poder público, bem como a importância dos debates para um desenvolvimento econômico sustentável.

    O artigo “Escravidão e liberdade no Brasil Império: um breve estudo sobre Leis e abolição gradual”, quinto texto da coletânea, foi escrito por Julio Cesar Costa Manoel e aborda a relação entre escravidão e liberdade durante o período imperial, e objetiva demonstrar que as leis implementadas após a independência não tinham como principal intuito abolir a escravidão, mas sim mantê-la por um tempo prolongado.

     O sexto artigo, “Necropolítica, mulheres negras e o direito de viver”, de autoria de Juliana Vaz do Nascimento e Priscila Alcântara Martins, examina as experiências das mulheres negras na sociedade brasileira e as violências sistemáticas que sofrem em diferentes espaços, com base no conceito de necropolítica.

      O texto “Abordando o racismo ambiental: o caso das periferias do Rio de Janeiro e a importância do ambiente escolar como arena de conversação”, de Julio Cesar Costa Manoel e Camilly Goes Cardoso, é o sétimo da coletânea e busca estudar as áreas mais pobres do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense, a fim de identificar onde a população negra está mais exposta a riscos ambientais. Ainda, dá enfoque ao ambiente escolar como espaço-chave para discutir e combater o racismo ambiental.

   O oitavo artigo, “Racismo tributário: a ausência de aplicação do princípio da capacidade contributiva e seus reflexos nas vidas das mulheres negras no Brasil”, de Carolina da Silva Barboza Lima, parte do projeto PRETITUDES ONTEM e HOJE – Por um Brasil de Verdade, visa compreender o processo de tributação com recorte de gênero e raça, e propõe medidas para promover a justiça social em favor das mulheres negras.

O artigo “Existe um Brasil sem povo preto?”, nono texto da coletânea, escrito por Ana Gleice dos Santos, apresenta reflexões sobre a questão racial como parte da identidade e da construção social do Brasil, de forma a oferecer uma análise crítica acerca da presença e da integração dos afrodescendentes na sociedade brasileira.

    O décimo e último artigo da obra, “Exibir o cotidiano negro: resistências femininas, por meio do vestir, no Rio de Janeiro Oitocentista”, de autoria de Beatrice Rossotti, estuda o uso de turbantes em fotografias de mulheres negras do século XIX no Rio de Janeiro e, ao considerar as roupas elementos históricos de análise, discorre sobre as manifestações de autodeterminação e resistência.

    Ao traçar os contornos da questão racial no Brasil, é necessário contextualizar as raízes históricas que fundamentam essas estruturas. Cada capítulo oferece uma abordagem única, explorando temas que vão desde a representação cultural até as políticas públicas, destacando a urgência de enfrentar o racismo e de buscar caminhos para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

     Gostaríamos de agradecer a toda a Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, da Subseção da OAB da Barra da Tijuca, especialmente à Presidente Elisabeth Baraúna e ao Vice-Presidente Julio Cesar Costa Manoel, que tornaram esta coletânea possível por meio de seu apoio e dedicação. Agradecemos também aos autores e revisores que contribuíram para a qualidade deste trabalho.

     Por fim, um agradecimento especial à amiga Beth Baraúna, que muito me honrou com o convite para participar de tão importante obra, com a deferência de fazer esta breve introdução e a difícil tarefa de resumir os qualificados textos, cuja leitura integral certamente será de grande valia.

     Esperamos que esta coletânea seja uma fonte de inspiração e conhecimento para todos e que os debates aqui suscitados sejam fonte de memória e, ainda, viabilizem políticas de reparação. Aproveite a leitura!

Marcia Dinis

Conselheira da OAB-RJ

Presidente da Comissão de Criminologia do IAB

 

 

 

 

 

POSFÁCIO

“Invisibilidades: reflexos do racismo e da escravidão no Brasil” é um livro que evoca uma profunda reflexão sobre as persistentes consequências sociais e culturais deixadas pela escravidão e pelo racismo estrutural na sociedade brasileira. Na história da escravidão no Brasil, que durou quase quatro séculos, resta clara a percepção de que não terminou com a assinatura da Lei Áurea em 1888 e suas sequelas continuam a afetar as vidas de milhões de afro-brasileiros, manifestando-se de diversas formas, desde a desigualdade socioeconômica até a violência racial, a marginalização cultural e segregação ambiental.

A “invisibilidade” mencionada reflete a ausência de representatividade negra em posições de poder e destaque na sociedade, onde negros frequentemente são sub-representados em setores como política, mídia, educação e negócios. Essa invisibilidade também se estende à negação da contribuição africana para a formação cultural, histórica e social do Brasil, uma herança rica que vai muito além da mera força de trabalho escravizada.

A obra destaca como o racismo estrutural opera para manter essa invisibilidade, perpetuando estereótipos negativos e limitando o acesso a oportunidades de desenvolvimento e reconhecimento. Os racismos multifacetados no Brasil sempre velados, negados pela mitificação da democracia racial, um conceito que sugere uma harmonia racial que não existe na prática. Essa negação impede a elucidação plena do problema e, consequentemente, a busca por soluções efetivas, por mais que existam políticas públicas para tal.

No decorrer da coletânea percebe-se a importância que a educação detém, sendo um dos campos mais afetados por essa herança de invisibilidade da verdadeira história da escravidão no Brasil. A história e a cultura negra, por exemplo, ainda lutam por espaço nos currículos escolares, o que contribui para a perpetuação da marginalização cultural. Na economia, a desigualdade racial se manifesta em disparidades salariais e de tributação, desemprego mais elevado entre negros e menor acesso a posições de liderança.

Por fim, temos uma obra que realmente visibiliza as mazelas brasileiras estruturais e institucionais às quais o combate não cessará tão cedo, porém, com ações afirmativas como essa da Comissão da Verdade da Escravidão Negra do Brasil da subseção OAB Barra da Tijuca – RJ, incentiva-se que a decolonialidade se aplique à mais esferas da sociedade brasileira para que se constitua efetivamente o que almeja a Constituição Federal vigente, uma sociedade equânime e justa.

Marcos Vinícius Jardim Rodrigues

Conselheiro do CNJ

 

Publicado: 12.09.2025