Liberdade de Imprensa versus Presunção de Inocência e a influência da mídia nos Processos Criminais.

Autores

  • Maíra Fernandes

Palavras-chave:

presunção de inocência, opinião pública, mídia, imprensa, processo penal, julgamentos criminais

Resumo

Presunção de Inocência versus exposição midiática do acusado. 2. A pressão da Opinião Pública em questões de natureza criminal. 3. A sociedade do espetáculo e a espetacularização dos processos criminais. 4. A simplificação, nem sempre positiva, dos processos criminais. 5. A “contaminação entre o direito e a comunicação social” e o descompasso entre o ritmo da mídia e o de um processo judicial . Considerações Finais.

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Considerações Finais

O que se vê muitas vezes, nos processos midiáticos, é uma espécie de retroalimentação entre os representantes do Poder Judiciário e a imprensa, o que pode influenciar a esperada imparcialidade dos julgadores: ao mesmo tempo em que o Poder Judiciário alimenta a imprensa com informações referentes aos processos em julgamento, esta mantém aceso o interesse da população nas notícias e pressiona os julgadores a decidir conforme o clamor popular.

Embora não haja fórmula específica sobre como lidar com essa questão, é possível afirmar que a liberdade de expressão e de imprensa pode ser perfeitamente compatível com o direito ao contraditório e à ampla defesa, se os meios de comunicação se limitarem a informar e não a pré-julgar, além de disponibilizarem tempo e espaço para as manifestações de representantes da advocacia ou da defensoria pública.

Evidente que a defesa técnica, por uma questão estratégica, pode preferir não se pronunciar. Mas é fundamental que os veículos de comunicação tenham, sempre, o cuidado de checar a veracidade das informações – é comum circularem fake news sobre processos criminais – e que faculte espaço para advogados ou defensores se pronunciarem sobre o que estiver sendo dito pela acusação.

Em tempos tão duros para o incompreendido direito de defesa, o exercício da advocacia em um caso midiático pode trazer um dificultador a mais: o de remar contra a maré, o de o profissional herdar para si a ira coletiva que, eventualmente, volta-se contra o cliente e que se manifesta, sobretudo, no anonimato das redes sociais. Nos Tribunais da Internet, as pessoas são acusadas, julgadas e condenadas na velocidade da luz.

Com efeito, não há dúvida de que não há democracia sem imprensa livre, e essa liberdade representa um poder extraordinário, que pode ser utilizado para o bem, ou para o mal. Para informar, ou para manipular. Não à toa, Joseph Stalin dizia que “a imprensa é a arma mais poderosa no nosso partido”, pensamento muito próprio de governos monocráticos ou antidemocráticos.

Justo por isso, tal poder precisa ser exercido com absoluta responsabilidade e com respeito, de modo irrestrito, às demais garantias constitucionais. Vale dizer: aos jornalistas, cabe informar e, ao juiz, cumpre julgar. Quando um jornalista julga e um juiz divulga, é porque algo está fora do lugar. Mais cedo ou mais tarde, as consequências disso acabam se tornando altamente prejudiciais para qualquer país.

[1] Advogada criminal, sócia do Escritório Maíra Fernandes Advocacia. Mestra em Direito e Pós-graduada em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora convidada da FGV Rio, da Universidade Cândido Mendes e de diversos cursos de especialização. Conselheira titular da OAB-RJ. Presidente da Comissão de Crimes Digitais da OABRJ e coordenadora do Departamento de Novas Tecnologias e Direito Penal do IBCCRIM.

[2] HESPANHA, António Manuel. Ibidem., p. 413.

[3] Artigo publicado, originalmente, em: Mulheres da Advocacia Criminal. Wanessa Rodrigues. (Org.) 1ed.:, 2021, v. 1.

[4] BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Rio de Janeiro: Tecnoprint S.A., p. 52.

[5] Trad. livre de “A free press can, of course, be good or bad, but, most certainly without freedom, the press will never be anything but bad”. CAMUS, Albert. Albert Camus, Quotes, Quotations, Famous Quotes. Createspace Independent Publishing Platform, 2016.

[6] Tal frase, muito conhecida e disseminada, é equivocadamente atribuída a Voltaire, mas nunca foi dita pelo filósofo, segundo os estudiosos de suas obras.

[7] LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 97.

[8] BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Rio de Janeiro: Tecnoprint S.A., 1969, p. 66.

[9] LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 96

[10] LOPES Jr., Aury. Idem., p. 97.

[11] LOPES Jr., Aury. Idem., ibidem.

[12]TJRJ. Ação Civil Coletiva nº 0131366-09.2013.8.19.0001, ainda sem trânsito em julgado. Sentença e apelação favoráveis aos pedidos formulados pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Informações sobre a decisão também disponíveis em: http://www.defensoria.rj.def.br/noticia/detalhes/8838-Decisao-obtida-pela-DPRJ-proibe-exposicao-de-presos-provisorios. Acesso em 20/05/20.

[13] Não se desconhece a relevante discussão acerca do sexismo linguístico, que merece ser evitado. Todavia, por questão de espaço e melhor fluência do texto, optou-se por adotar as palavras, tão somente, no gênero masculino, compreendidas como o denominado “termo neutro”, a englobar homens e mulheres. Assim, por “preso” leia-se “preso ou presa”. Da mesma forma, advogados e advogadas, juízes e juízas, dentre outros exemplos.

[14] TJRJ. Ação Civil Coletiva nº 0131366-09.2013.8.19.0001. Sentença proferida em 19/10/2015:” JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, confirmando a antecipação de tutela deferida, para condenar o Estado do Rio de Janeiro, por intermédio de seus agentes púbicos (Delegados de Polícia, Policiais Militares, Agentes da SEAP, entre outros), em se tratando de Pessoas presas provisoriamente, somente divulguem o(s) nome(s) do(s) acusado(s), descrição dos seus atributos físicos juntamente com o fato(s) imputado(s) sem qualquer divulgação de imagem ou foto. Caso não opte pela divulgação nos termos declinados acima, o Estado do Rio de Janeiro, por meio de seus agentes públicos, deverá motivar previamente, e de maneira clara, congruente e explícita, as razões para a exibição de foto ou imagem involuntária, desde que o façam de maneira a não possibilitar a imediata identificação do encarcerado provisório, SALIENTANDO, SOBRETUDO, A UTILIDADE DA EXPOSIÇÃO PARA A PERSECUÇÃO PENAL, PRÉ-PROCESSUAL E PROCESSUAL, sob pena de multa de R$10.000,00 (dez mil reais) para cada exposição, multa que será revertida a titulo de indenização para o preso cuja imagem foi indevidamente exposta”.

[15] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 1997, p. 28.

[16] Confira-se, por exemplo, a imagem do ex-governador do Estado do Rio de Janeiro, algemado nas mãos, na cintura e nos pés “Cabral é levado ao IML de Curitiba com algemas nos pés e nas mãos”. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/01/1951755-cabral-e-levado-ao-iml-de-curitiba-com-algemas-nos-pes-e-nas-maos.shtml. Acesso em 20.05.2020.

[17] MENDES, André Pacheco Teixeira. Por que o Legislador quer aumentar penas? Belo Horizonte: Del Rey, 2019.

[18] DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2017, p. 37.

[19] DEBORD, Guy. Op. Cit., p.38.

[20] HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito, Op, Cit., p. 421.

[21] Por ex.: a prisão do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, foi transmitida ao vivo e reprisada, várias vezes, durante o dia na TV. DIONÍSIO, Bibiana et. al. Eduardo Cunha é preso em Brasília por decisão de Sérgio Moro. Deputado foi levado em avião da Polícia Federal para Curitiba. Prisão é por tempo indeterminado e referente a processo por propina.Publ: 19/10/2016 13h29. Do G1 PR, da RPC e da GloboNews http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2016/10/juiz-federal-sergio-moro-determina-prisao-de-eduardo-cunha.html. Acesso em 20/05/2020.

[22] SCHREIBER, Simone. A Publicidade Opressiva De Julgamentos Criminais. Uma investigação sobre as consequências e formas de superação da colisão entre a liberdade de expressão e informação e o direito ao julgamento criminal justo, sob a perspectiva da Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

[23]Confira-se a longa matéria em: http://g1.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/videos/v/prisao-de-marcelo-odebrecht-foi-capitulo-marcante-da-lava-jato/6368048/ Acesso em 20/05/2020.

[24] SCHREIBER, Simone. Op.Cit., p. 412.

[25] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Op. Cit., p. 23.

[26] BOURDIEU, Pierre. Ibidem., p. 25.

[27] BOURDIEU, Pierre. Op. Cit., p. 40.

[28] MORO, Sérgio; BOCHENEK, Antônio Cesar. O problema é o processo. Publicado em 29 Mar. 2015. JORNAL ESTADÃO. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/o-problema-e-o-processo/>. Acesso em 20/05/2020.

[29] HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito. Op. Cit., p. 420.

[30] HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito. Op. Cit., p. 421.

[31] HESPANHA, António Manuel. Op. Cit., p. 423.

[32] HESPANHA, António Manuel. Ibidem., p. 413.

[33] HESPANHA, António Manuel. Ibidem., p. 413.

[34] Confira-se em: https://noticias.r7.com/prisma/arquivo-vivo/so-a-imprensa-tem-culpa-no-escandalo-da-escolinha-do-sexo-01022018. Acesso em 20/05/2020.

[35] BOURDIEU, Pierre. Op. Cit., p. 28.

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Publicado

11.09.2025

Como Citar

Maíra Fernandes. (2025). Liberdade de Imprensa versus Presunção de Inocência e a influência da mídia nos Processos Criminais. Revista Eletrônica Da OAB-RJ. Recuperado de https://revistaeletronicaoabrj.emnuvens.com.br/revista/article/view/467

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