ESPAÇO DE DISCUSSÃO 6: CIDADE E DIREITO

Autores

  • Alessandra Marchioni

Palavras-chave:

direito à moradia adequada, comunidade tradicional de pescadores, Maceió

Resumo

Essa pesquisa tem como objetivo principal apresentar elementos para uma compreensão mais precisa sobre o fenômeno da “produção capitalista do espaço” urbano na cidade de Maceió, Alagoas, Brasil. Nesse sentido, se justificaria a oportunidade de colocar em prática processos de transformação urbana, atração de investimentos e reposicionamento da cidade através de sua renovação. Esse foi o caso da valorização imobiliária da costa litorânea de Maceió, onde se situa a “Villa dos Pescadores”. Assim, é possível afirmar que o processo de “territorialização” das cidades, promovido pelo Estado, desde una dinâmica capitalista, primeiro afeta as comunidades originárias, incidindo principalmente pelos grupos socialmente excluídos e profundamente segregados. O uso social do direito (“direito à moradia adequada”) aparece como elemento essencial à produção e reprodução dessas estruturas, porque distingue lugares e posições sociais, através de seus atos simbólicos de nomeação, como as decisões judiciais. Nessa pesquisa, será utilizado o método de abordagem sociológico de Pierre Bourdieu, com enfoque para a identificação do habitus praticado por aquela comunidade tradicional, relacionado aos campos social e jurídico.

 

Abstract: This investigation has the main objective to provide elements for a more precise comprehension about the phenomenon of the “capitalist production of urban space” in the city of Maceió, Alagoas, Brazil. In this sense, this would justify an opportunity to put in place processes to urban transformation, attracting investments and the city repositioning by its renewal. This was the case of the real estate valuation of the littoral coast of Maceió, where was the “Fishermen’s Village”. Therefore, it is possible to claim that the process of “territorialisation” of the urban space, promoted by the State through a capitalist dynamic, first affects the primitive communities, mainly among socially excluded groups already deep segregated. The social use of the law (“right to adequate housing”) appears as an essential element of the production and reproduction of these structures, because distinguishes places and social positions, through its symbolic acts of naming, such as the judicial decisions. . In this research, it will be used the Pierre Bourdieu's sociological approach method, focusing on the identification of habitus practiced by that traditional community, related to social and legal fields

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Referências

Referências

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NOTAS:

[1]Trabalho apresentado no Espaço de Discussão E6 (Cidade e Direito) do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[2] Professora da Universidade Federal de Alagoas. Doutora em Direito (UFSC).

[3]A cidade marketing pode ser observada nas imagens e nos textos e nos slogans de guias turísticos. Frequentemente trechos das canções: Maceió (Lourival Passos) e de Ponta de Lápis (Antônio Roberto Brandão Barbosa e Marcos Maceió) poetizam a cidade de Maceió, suas belezas e encantos e em que Maceió é apresentada como exemplo máximo de perfeição da natureza e da vida no “Paraíso das águas” (SILVA, 2015).

[4]Segundo Maricato (2012, p.129), o modelo urbano estatal sucumbiu à internacionalização dos capitais, sobre a qual se fundou o Estado pós-moderno. Nesse Estado, que passa a assumir características neoliberais, deixa-se de acolher estratégias keynesianas de geração e emprego e aumento salarial para viabilizar as ações do mercado financeiro e os empreendimentos típicos produzidos por uma geração de “cidades globais”.

[5]O período atual revela um padrão de dominação externa que se dá em conjunto com a expansão das grandes empresas corporativas e imobiliárias, empresas que trouxeram um novo estilo de organização, de produção e de marketing, com novos padrões de planejamento. As grandes cidades brasileiras têm características de uma urbanização corporativa, baseada na noção de crescimento econômico e na especulação imobiliária daí derivada (FERNANDES,2006, p. 18).

[6]Para David Harvey (2005), o processo de acumulação pode se dar com a criação de novos desejos e necessidades, como o estímulo a boa moradia, ou pela expansão do comércio para novas regiões geográficas (p.48).

[7]A morfologia dos assentamentos favelados apresenta peculiaridades decorrentes das características próprias dos terrenos ocupados: em encostas ou áreas planas, em áreas alagáveis ou pantanosas, próximas a vias de acesso e “tráfego pesado”, com alta densidade populacional (GONDIM, 2010).

[8]O campo social definido por Bourdieu (2001, p. 120) não é uma estrutura determinada, mesmo que seu funcionamento corresponda às “leis gerais dos campos”. A estrutura do campo é o produto da história desse campo, quer dizer, a história das posições constitutivas desse campo e aquelas que ele favorece.

[9]Segundo Cardoso (2003,p.3-4): “os territórios pesqueiros são construídos pelos pescadores a partir do trabalho e da apropriação da natureza, territórios que podem ser delimitados, mesmo na fluidez do meio aquático e sobre os quais pescadores exercem algum domínio”. Ambos os elementos fazem referência à ação e à memória das comunidades tradicionais, porque se tornam essenciais para a reprodução daquele modo de vida.

[10]Existem os pescadores, as marisqueiras, os pombeiros, e os diferentes ganhos entre essas funções. Esses ganhos podem ser sociais (posições sociais) econômicos (renda obtida) e sempre simbólicos, relativos aos papeis de representação e legitimidade para decidir “as coisas” da Vila.

[11]O processo de urbanização alagoano foi intensificado, nas últimas décadas, em parte, devido a migrações internas (interior/capital) motivadas pelo processo de mecanização das usinas de cana-de-açúcar, que reduziu as oportunidades de emprego (LINS, 2010).

[12]O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC)/1966, que em seu art. 11 destaca: “Os Estados -parte reconhecem o direito de toda a pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e para a sua família, inclusive (...) moradia adequada” (NAÇÕES UNIDAS, 1966). Esta noção mereceu uma interpretação extensiva através do Comentário n. 04 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais/1991: “Segundo o ponto de vista do Comitê, o direito à habitação não deve ser interpretado em um sentido restrito ou restrito que o equipara com, por exemplo, o abrigo provido meramente de um teto sobre a cabeça dos indivíduos”(...) “deve ser lido referindo-se não apenas como habitação, mas como habitação adequada (...) habitação adequada significa privacidade adequada, espaço adequado, segurança, iluminação e ventilação adequadas, infraestrutura básica daquela e localização adequada em relação ao trabalho e facilidades básicas, tudo com um custo razoável” (NAÇÕES UNIDAS, 1991)

[13]“Gentrificação” é um termo utilizado para caracterizar o processo de valorização imobiliária de uma zona urbana que, na maioria dos casos, vem acompanhada do deslocamento dos habitantes de classes sociais mais baixas para outro local e, ao mesmo tempo, atrai para aquele local pessoas com maior poder econômico.

[14]Juntamente com pelo menos outros quatro tipos de conflito, a saber: condições de inabitabilidade e insegurança jurídica da posse em periferias; comunidades econômica e socialmente vulneráveis e a moradia em área de risco; deslocamentos forçados de comunidades tradicionais e quilombolas; planos e projetos urbanos sem participação e aprovação popular.

[15]No interior do campo jurídico, é a autoridade jurídica investida do poder de violência física e simbólica, legitimada pelo monopólio estatal, que produz e exerce, respectivamente, teoria e prática jurídicas. Essa posição privilegiada da autoridade jurídica em relação ao leigo, não afasta a possibilidade de conflitos internos de competência entre as próprias autoridades jurídicas e jurisdicionais (BOURDIEU, 2000, p.211).

[16]Segundo Bourdieu (2004, p. 21), qualquer campo científico é um mundo social e, como tal, faz imposições, solicitações relativamente independentes às pressões sociais que o envolve. No caso das pressões externas envoltas ao campo jurídico, observa-se que elas aparecem retraduzidas pela própria lógica do campo, que por sua natureza social, não consegue se desvencilhar completamente do ponto de vista das outras ciências.

[17]O “efeito de apriorização” está associado à estrita hierarquia jurídica, não só pelas instâncias judiciais e os seus poderes, mas pelas decisões e interpretações em que se apoiam, como também relacionada às normas e às fontes que conferem a autoridade de suas decisões (BOURDIEU, 2000, p.214)

[18]A competência do juiz é a autorização legal que essa autoridade estatal detém para decidir os conflitos levados à jurisdição do Estado, é a parcela de jurisdição que compete a cada órgão jurisdicional.

[19]Trabalho apresentado ao Espaço de Discussão 6 (Cidade e Direito) do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[20]Doutoranda no Programa de Pós Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Professora de Direito Processual Penal do Centro Universitário Augusto da Motta (UNISUAM).

[21]Mestranda no Programa de Pós Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF). Bacharel em Direito pela Universidade Candido Mendes (UCAM).

[22]Licenciando em Geografia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e licenciado em História pela Universidade Federal Fluminense.

[23] Trabalho apresentado ao Espaço de Discussão 6 (Cidade e Direito) do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[24]Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná, com bolsa pela CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Graduada em Direito pela UFPR. Integrante do NEFIL – Núcleo de Estudos Filosóficos e do Núcleo de Direito Cooperativo e Cidadania, ambos vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPR.

[25]A pesquisa realizada pela Fundação João Pinheiro é realizada a partir dos dados extraídos da PNAD de 2013-2014. A metodologia adotada pela instituição de pesquisa abrange os seguintes elementos: domicílios precários, coabitação familiar, ônus excessivo com aluguel urbano e adensamento excessivo de domicílios alugados (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2016).

[26]O indicador aglomerados subnormais é constituído pelas ocupações formadas por no mínimo 51 unidades habitacionais, desprovidas de serviços públicos essenciais ou que a urbanização seja fora dos padrões vigentes (IBGE, 2017). Esse conceito não abarca todo o déficit habitacional, por exemplo, não considera o ônus excessivo com o aluguel, mas é interessante sua utilização devido a sua maior abrangência na coleta de dados.

[27]O indicador de domicílio vago contabiliza os imóveis em construção, mas não considera os de ocupação ocasional ou que os moradores não estiveram presentes durante a pesquisa (PORTAL BRASIL, 2010).

[28]Em 2014, o déficit habitacional da faixa de renda até três salários-mínimos representava 83,9% do total do déficit habitacional urbano (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2016).

[29]Em 2013, foi realizada pesquisa pelo LabCidade com moradores de empreendimentos do PMCMV faixa 1, nas regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas, Baixada Santista e Região Administrativa de Ribeirão Preto, com base na aplicação de 930 questionários (ROLNIK, 2015, p. 315).

[30] O direito à moradia é direito social assegurado no artigo 6º da Constituição Federal e no artigo 11 do PIDESC, que foi recepcionado no ordenamento jurídico brasileiro, por meio do Decreto nº 591/1992. No tocante ao PIDESC, o Comentário Geral nº 4 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais estabeleceu elementos mínimos do direito à moradia.

[31]Segundo Sachs (1999: 150, apud BARAVELLI, 2006, p. 93), o Profilurb tinha como objetivo a prevenção ao crescimento das favelas, enquanto que o Promorar visava sua reabilitação, já que partia do pressuposto que não podiam ser extintas pela realocação de seus moradores para locais distintos. Por outro lado, o Programa João de Barro atuou mediante o financiamento de 7 mil unidades habitacionais para famílias de baixa renda que viviam em habitações unifamiliares isoladas em lotes periféricos, realidade pertencente principalmente a pequenas cidades do interior do Norte e Nordeste (BARAVELLI, 2006, p. 92).

[32]Segundo o artigo 53 do Código Civil, as associações são caracterizadas como “união de pessoas que se organizem para fins não econômicos” (BRASIL, 2002). Já as cooperativas são sociedades de pessoas, constituídas para exercer atividade econômica em proveito comum de seus associados (BRASIL, 1971).

[33]O cooperativismo popular insere-se dentro do âmbito da economia solidária, que também envolve outras experiências não limitadas a forma jurídica cooperativa, podendo também consistir em associações ou grupos informais (GEDIEL, MELLO, 2016, p. 201). A economia solidária possui os seguintes objetivos: “produzir um bem ou serviço de modo sustentável e sem ter por finalidade o lucro; gestão independente do Estado; estruturas associativas; processo decisório democrático com ênfase na participação e na cooperativa, assim como primazia das pessoas e do trabalho sobre o capital” (CARLEIAL & PAULISTA, 2008, p. 5).

[34]Nesse contexto, atuavam fortemente a União Nacional de Luta por Moradia - UNMP, com incidência em processos de autogestão, o Movimento Nacional de Luta por Moradia - MNLM, com atuação em ocupação de terras, a Confederação Nacional das Associações de Moradores - CONAM, vinculada a entidades de bairro, associações comunitárias, e a Central de Movimentos Populares - CMP, que engloba movimentos populares diversos, como “ONGs de mulheres, movimentos de negros, de moradia e comunitários, passando pelos movimentos culturais, de rádios comunitárias, indígenas e ecológicos” (FERREIRA, 2012, p. 122). Além disso, na Constituinte houve a reunião de várias organizações para encaminhar uma proposta de Emenda Popular de Reforma Urbana, que propiciou a organização do Movimento Nacional de Reforma Urbana, posteriormente denominado de Fórum Nacional de Reforma Urbana, que envolve muitas entidades “em torno da defesa da reforma urbana, da gestão democrática e da promoção do direito à cidade” (FERREIRA, 2012, p. 123).

[35]O PAR foi um programa criado para atender a demanda habitacional da população de baixa renda, mediante o arrendamento residencial com a possibilidade de compra do imóvel (BRASIL, 2001).

[36]O PAC permite transferências de recursos de órgãos ou entidades da União para Estados, Distrito Federal e Municípios para execução de ações do PAC (BRASIL, 2007). Em relação a sua modalidade de urbanização de assentamentos precários possibilitou a destinação de recursos para o melhoramento das “condições de habitação e mobilidade em assentamentos precários em centros urbanos, com obras de infraestrutura como construção de moradias, drenagem, abastecimento de água, esgotamento sanitário e iluminação pública” (PAC, 2017).

[37]No direito brasileiro, ato cooperativo é “tradicionalmente reconhecido como o realizado na relação entre cooperado e cooperativa ou na relação entre cooperativas, quando associadas, para a consecução dos seus objetivos sociais” (GEDIEL; MELLO, 2016, p. 198), definição que também é adotada no artigo 79 da Lei nº 5.764/71. O artigo 9º da Lei uruguaia 18.407/2008 dispõe que os atos cooperativos são aqueles realizados entre cooperativas e seus sócios ou os sócios de cooperativas sócios ou entre cooperativas entre si quando estiverem associadas (URUGUAI, 2008). Além disso, o ato cooperativo deve ser uma execução em cumprimento direto do objeto da cooperativa (CAZERES, 1994, p. 31). Por isso, o objeto do ato cooperativo de moradia é a prestação ou obtenção de serviço cooperativo de moradia (CORVALAN, 1990, p. 151, apud CAZERES, 2008, p. 36).

[38]Adota-se neste trabalho a definição de movimentos sociais de Daniel Camacho (1997, p. 216 e 217) que os considera “uma dinâmica gerada pela sociedade civil, que se orienta para a defesa de interesses específicos. Sua ação se dirige para o questionamento, seja de modo fragmentário ou absoluto, das estruturas de dominação prevalecentes, e sua vontade implícita é transformar parcial ou totalmente as condições de crescimento social”. Por isso, apesar da constituição formal da FUCVAM como federação de cooperativas, sua atuação é condizente com a de um movimento social.

[39]Trabalho apresentado ao Espaço de Discussão ED 6 – Cidade e Direito do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[40]Doutoranda em Direito, área de concentração Direitos Humanos, do Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal do Pará. Mestre em Direito pelo Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Contato: ei_flavia@hotmail.com.

[41]A denominação Consenso de Washington faz referência a um documento apresentado pelo Institute for International Economics em uma reunião em Washington DC., Estados Unidos, em 1989, com propostas de reformas que já vinham sendo aplicadas em alguns países da América Latina e que eram consenso entre os membros do Congresso e governo estadunidense, tecnocratas das instituições financeiras internacionais, agências econômicas do governo norte-americano e o Federal Reserve Board (BANDEIRA, 2002, 35). Este conjunto de políticas macroeconômicas previa um amplo programa de reformas estruturais dirigidas aos países da periferia (OLIVEIRA, 2011, 146), com recomendações de que o Estado se retirasse da economia, seja como empresário ou como regulador das transações domésticas e internacionais, a fim de que toda a América Latina se submetesse às forças do mercado. A adoção de tais medidas constituiria condição fundamental para que estes Estados pudessem renegociar a dívida externa e receber qualquer recurso das agências financeiras internacionais, como o Bando Mundial e Fundo Monetário Internacional. A ratificação da proposta neoliberal tornava-se condição para negociar qualquer cooperação financeira externa, bilateral ou multilateral, de forma que os países teriam que sujeitar suas respectivas políticas econômicas e decisões de investimentos à fiscalização internacional, por meio das condicionalidades. Os principais países latino-americanos ficaram diante do seguinte dilema: ou declaravam moratória ou se submetiam aos órgãos intergovernamentais de regulação financeira. A quase totalidade dos governos acabou optando pela segunda alternativa (SINGER, 1996, 164).

[42]Actualmente, as zonas centrais da economia-mundo capitalista coincidem com sociedades predominantemente brancas/europeias/euro-americanas, tais como a Europa Ocidental, o Canadá, a Austrália e os Estados Unidos, enquanto as zonas periféricas coincidem com povos não-europeus outrora colonizados. O Japão é a única excepção que confirma a regra, na medida em que nunca foi colonizado nem dominado pelos europeus e, à semelhança do Ocidente, desempenhou um papel activo na construção do seu próprio império colonial. A China, embora nunca colonizada na sua totalidade, viu-se periferizada pelo uso de entrepostos coloniais como Hong Kong e Macau, e por intervenções militares directas (GROSFOGUEL, 2008, 127).

[43]“[...] refugiados e pessoas deslocadas internamente, afetadas por conflitos, desastres e mudanças climáticas ou ameaçadas por esses fatores; pessoas em terras destinadas a projetos de desenvolvimento ou afetadas por estes; ocupantes de terras valiosos; inquilinos com ou sem títulos legais, em assentamentos informais ou em contextos formais, em áreas urbanas e rurais; migrantes internos ou internacionais; minorias; comunidades nômades; grupos afetados por discriminação baseada em casta ou estigma; pobres, sem-terra, sem-teto; arrendatários; trabalhadores em regime de servidão; outros grupos marginalizados, como pessoas com deficiências ou vivendo com HIV; povos nativos em países com histórico de colonização; grupos com direitos consuetudinários à terra; e até proprietários privados de casas hipotecadas” (ROLNIK, 2015, p. 151).

[44]Trabalho apresentado ao Espaço de Discussão 6 - Cidade e Direito do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[45]Advogada formada em Direito pela Universidade Federal do Ceará e ex-membro do Núcleo de Assessoria Jurídica Comunitária (NAJUC), projeto de extensão da Faculdade de Direito da UFC.

[46]Opto por utilizar a expressão “transporte coletivo” ao invés de “transporte público” por acreditar que o transporte coletivo não é verdadeiramente público. A tarifa é uma grande barreira que impede que diversas pessoas consigam acessá-lo.

[47] Sindiônibus é o Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Ceará.

[48]Em Fortaleza, o usuário dos ônibus entra pela porta traseira do veículo e sai pela porta dianteira. Desse modo, uma das alternativas para quem não tem recursos financeiros para pagar a passagem é embarcar e desembarcar pela porta traseira, prática conhecida como fazer traseira.

[49]O direito à cidade é garantido pela Constituição Federal em seus arts. 182 e 183. Ele pode ser definido como “o usufruto eqüitativo das cidades dentro dos princípios de sustentabilidade, democracia, equidade e justiça social. É um direito coletivo dos habitantes das cidades, em especial dos grupos vulneráveis e desfavorecidos, que lhes confere legitimidade de ação e organização, baseado em seus usos e costumes, com o objetivo de alcançar o pleno exercício do direito à livre autodeterminação e a um padrão de vida adequado. O Direito à Cidade é interdependente a todos os direitos humanos internacionalmente reconhecidos, concebidos integralmente, e inclui, portanto, todos os direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais que já estão regulamentados nos tratados internacionais de direitos humanos. Este supõe a inclusão do direito ao trabalho em condições eqüitativas e satisfatórias; de fundar e afiliar-se a sindicatos; de acesso à seguridade social e à saúde pública; de alimentação, vestuário e moradia adequados; de acesso à água potável, à energia elétrica, o transporte e outros serviços sociais; a uma educação pública de qualidade; o direito à cultura e à informação; à participação política e ao acesso à justiça; o reconhecimento do direito de organização, reunião e manifestação; à segurança pública e à convivência pacífica. Inclui também o respeito às minorias e à pluralidade étnica, racial, sexual e cultural, e o respeito aos migrantes” (CARTA MUNDIAL PELO DIREITO À CIDADE, 2006).

[50]Trens, metrôs e barcas estão presentes em apenas algumas cidades do país. Por isso, focarei meu estudo nos ônibus, que, nas cidades com mais de 60 mil habitantes, são responsáveis por 86% do transporte coletivo (ANTP apud VASCONCELLOS, 2016, p. 62). Os ônibus urbanos e metropolitanos operam em cerca de 85% dos municípios brasileiros (IPEA, 2010, p. 546).

[51]Em algumas cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, a fim de combater esses assédios, o governo implementou o “vagão rosa”, que é um vagão do trem ou metrô destinado apenas para mulheres, e o assento preferencial para mulheres. Sou contra essas políticas públicas. Ao invés de coibir o agressor, isola-se a vítima. Ademais, a mulher que escolhe não ficar no vagão rosa ou no assento preferencial é mal vista, como se estivesse querendo ser assediada. Também é necessário levar em conta que apenas um vagão (no total de 6 no metrô de São Paulo) é destinado apenas para mulheres, sendo que elas compõem a maioria da população brasileira (BRASIL, 2015), então elas são confinadas em um espaço extremamente limitado. No caso dos assentos preferenciais, eles foram criados para ajudar pessoas com dificuldades de locomoção ou de se manter em pé, seja por serem idosas, gestantes, terem alguma deficiência ou estarem com uma criança de colo. Colocar a mulher como alguém nessa situação, dizendo que ela deve ficar sentada, é muitíssimo inadequado. Além disso, estar sentada não impede o assédio, visto que o assediador ainda poderá, por exemplo, ficar olhando para o decote da mulher ou ficar se esfregando em seu ombro e braço. O MPL Florianópolis (2013) afirma que “se por um lado o Estado está reconhecendo a necessidade de políticas de mobilidade voltadas às mulheres, por outro a opção que se faz com tal medida é a de responsabilizar as passageiras por sua segurança. Ou seja: segrega-se as possíveis vítimas e não os violentadores”.

[52]Isso faz com que os usuários sejam feitos de “Cinderela”, dado que, na maioria das cidades do país, a frota de ônibus circula apenas até a meia noite. Em algumas cidades, como Fortaleza, há os corujões, que são ônibus que circulam durante a madrugada. Todavia, o tempo de espera entre um ônibus e outro é extremamente demorado e as linhas cobrem uma pequena região da cidade.

[53]Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] III - erradica a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

[54]O Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) garante, em seu art. 39, a gratuidade no transporte coletivo para pessoas com mais de 65 anos, e faculta às legislações locais estender esse direito para pessoas a partir de 60 anos. Em Fortaleza, crianças com 7 anos e/ou até 1,10 m de altura também não pagam passagem. (FORTALEZA, 2013)

[55]No Brasil, a lei nº 8.899/94 garante a gratuidade no sistema de transporte coletivo interestadual para pessoas com deficiência. No âmbito municipal, isso varia de acordo com a legislação local. Em Fortaleza, a lei complementar nº 0057/2008 garante a gratuidade no transporte coletivo urbano para as pessoas com deficiência.

[56]Esse é o valor atual da bolsa de permanência concedida aos estudantes de instituições federais de ensino superior que se encontram em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Seu valor é estabelecido pelo Ministério da Educação. (MEC, s.d.).

[57]Na UFC, apenas os estudantes que moram na residência universitária (estudantes de baixa renda oriundos de municípios diferentes dos de onde fica o campus onde estudam) ou que têm isenção no RU por serem de baixa renda podem tomar café da manhã no RU.

[58]Disponível em: < https://www.mobilicidade.com.br/bicicletar/comoutilizar.aspx>. Acesso em: 01 abr. 2018.

[59]Disponível em: <https://freepublictransport.info/city/>. Acesso em: 01 abr. 2018.

[60]De acordo com o princípio da insignificância, “é necessária uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Frequentemente, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material, por não produzirem uma ofensa significativa ao bem jurídico tutelado. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a sem lesado. (...) a insignificância da ofensa afasta a tipicidade.” (BITENCOURT, 2013, p. 369-370)

[61]Estado de necessidade é a “colisão de bens jurídicos de distinto valor, devendo um deles ser sacrificado em prol da preservação daquele que é reputado como mais valioso” (BITENCOURT, 2013, p. 409). No caso em tela, há a colisão entre o acesso ao direito social ao transporte e a proteção ao patrimônio das empresas de transportes.

[62]Segundo Émile Pouget (apud FARJ, 2009, p. 117), “a ação direta acontece quando o próprio movimento social em reação constante contra o meio atual, nada espera dos homens, das potências ou das forças exteriores a ele, mas [...] cria suas próprias condições de luta e retira de si mesmo seus meios de ação. [...] Portanto, a ação direta é a clara e pura concreção do espírito de revolta: materializa a luta de classes que ela faz passar do campo da teoria e da abstração ao campo da prática e da realização. Em conseqüência, a ação direta é a luta de classes vivida no dia-a-dia, é o assalto permanente contra o capitalismo”.

[63]Ver apêndice A.

[64]Ver apêndice B.

[65]Região central de Fortaleza junto à praia, onde moram pessoas com elevado poder aquisitivo e há diversos equipamentos de lazer.

[66]Tipo penal é a descrição, na legislação penal, de uma conduta delitiva. Tipificar é quando o legislador descreve, de modo abstrato, uma conduta e a classifica como crime.

[67]Resumo de artigo apresentado ao Espaço de Discussão 6 (Cidade e direito) do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[68]Graduada em Direito pela UFSM. Mestranda da linha de pesquisa direito da cidade pela e atualmente Mestranda da área de concentração Pensamento Jurídico e Relações Sociais, linha de pesquisa Direito da Cidade (UERJ)

[69]BOTELHO, Adriano. O urbano em fragmentos: a produção do espaço e da moradia pelas práticas do setor imobiliário- São Paulo: Annablume; Fapesp, 2007

[70]Recentemente foi aprovada a LEI Nº 13.465, DE 11 DE JULHO DE 2017, que regulamenta atualmente as regularizações fundiárias baseadas essencialmente no título, descaracterizando a multidisciplinariedade desse processo. A medida provisória que gerou essa lei, 759, gerou bastante polêmica entre os movimentos sociais e acadêmicos, na medida em que foi verifcado um retrocesso nessa área. Recebeu mais de 700 emendas, entretanto a essência ‘legalizadora’ seguiu existindo.

[71]Trabalho apresentado ao Espaço de Discussão Cidade e Direito do 7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

[72]Professora de Direito do programa de Ciências Econômicas e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA. Mestra em Direito Constitucional pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Especialista em Política e Planejamento Urbano pelo IPPUR/UFRJ;

[73]Graduando em Gestão Pública e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA

[74]Projeto de Assentamento Agroextrativista realizado pelos Projetos de assentamentos de reforma agrária reconhecidos pelo Incra, criados por outras instituições governamentais para acesso às políticas públicas do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA).Fonte:<http://www.incra.gov.br/assentamentoscriacao>

[75]Área de Proteção Ambiental (APA) localizada no município de Santarém, é uma extensa área natural destinada à proteção e conservação dos atributos bióticos (fauna e flora), estéticos ou culturais ali existentes, importantes para a qualidade de vida da população local e para a proteção dos ecossistemas regionais, e que vem sendo alvo dos olhares dos interesses econômicos para transformação em área portuária. Fontes:<http://www.oeco.org.br/dicionarioambiental/29203-o-que-e-uma-area-de-protecao-ambiental/>

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Publicado

28.10.2025

Como Citar

Alessandra Marchioni. (2025). ESPAÇO DE DISCUSSÃO 6: CIDADE E DIREITO. Revista Eletrônica Da OAB-RJ. Recuperado de https://revistaeletronicaoabrj.emnuvens.com.br/revista/article/view/640

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